Crônica
A saudade pastora a minha tristeza. Mergulhado no silêncio da solidão,
sinto explodir o peito, rompendo os drenos da emoção, fazendo marejar os olhos,
turvados pela imensidão do infinito, que, a cada momento, parece levar a sua
imagem para um ponto mais distante.
Sou uma figura decorativa, neste dia, em que se comemora o dia das mães.
Vagueio por um vazio imenso, sozinho, esmagado pelo entusiasmo da multidão. Não
sei se devo rir ou chorar. Se ficar calando em sinal de respeito ao meu próprio
desdém, ou deixando externar a grande tristeza, num caminhar sem rumo, molhando
a estrada por onde passo com os vestígios de minha saudade.
Mamãe, depois de sua partida, tudo mudou. Desapareceu o colorido do
mundo dos sonhos e um véu negro cobriu de luto o universo cruel das desilusões.
Como dói assistir à esperança morrer tão cedo, porque é a terrível certeza do
desengano cedo demais chegar.
Neste meu caminhar de angústias, olho e não vejo o seu rosto. Falo. Você
não escuta. Chamo. Você não responde. Choro. Ninguém me consola. Não há mãos
que enxuguem o meu pranto. Estendo os braços e não sinto o apoio de seu corpo,
tenho medo de fraquejar e cair.
Resta-me a irresistível saudade. Esta lembrança que me maltrata e me
entristece é a mais sublime forma de viver a alegria de sua companhia no
passado. Choro a sua ausência porque você representou a forma viva de amor que
conheci. A força que me impulsionava para a luta. A luz que me guiava nos
caminhos difíceis da vida. A voz que comandava os meus passos. O sorriso que
incentivava e o bastão em que me apoiava para compensar as minhas fraquezas.
Quando você partiu levou grande parte de mim mesmo. Levou minha
infância, meus brinquedos, e as pétalas coloridas das rosas que floriam no
jardim da minha alegria. O entusiasmo de viver foi substituído pelo pesar que
fez morada na sala de meus pensamentos. Para fugir à realidade, consola-me
sonhar, quando então a vejo, a escuto, a toco, e a sinto novamente perto de
mim. Mas, como é difícil sonhar com os sonhos de meus sonhos! Depois de
vagar pelas nuvens do devaneio, reencontro-me com a cruel realidade da eterna
separação.
Mamãe, por que você se foi tão cedo? Por que partiu assim levando a
minha alegria e deixando esta saudade? Por que seu coração que tanto amava
deixou de bater e seus olhos fecharam-se para o mundo que um dia sonhou em
construir para mim? Por que suas pernas pararam na caminhada que um dia me
ensinou a fazer, guiando-me as primeiras passadas? Por mais que tente, é
impossível esquecê-la. Tudo me recorda você.
Quando vejo a agressão e a violência, lembro-me de sua afeição e de seu
amor. Quando sinto a traição, mais me recorda a grandeza de sua alma, leal e
sincera. Quando a inveja me fere e o egoísmo me atinge, choro a lembrança de
seu poder de renúncia e a invejável capacidade de doação.
Quando as bofetadas me ferem o rosto, mais sinto as suas mãos que me
acariciavam e me faziam dormir na quietude da afeição. Quando a injustiça
acorrenta os sagrados direitos da liberdade e da justiça, vivo o esplendor de
seu exemplo, vivido no caminho que Cristo palmilhou, onde a verdade não pode
ser sufocada pela vil presença da mentira. Quando alguém gargalha de meu
fracasso, sinto a sua presença a apiedar-se de minhas fraquezas, induzindo-me
coragem para levantar, enfrentar, lutar e vencer.
Mamãe, impossível esquecê-la. Procuro você ansioso na luz que nasce a
cada dia. Durmo embalado pela escuridão das noites, buscando, nos sonhos, o
encontro com o seu amor. Como a posso esquecer, se a procuro em todas as
esquinas da vida? Se as minhas dores ficam sem alento e as alegrias não vão
além de vagas esperanças de um dia voltar a abraçá-la, beijá-la, tocá-la e
dormir, quieto, no aconchego de seus braços?
Neste dia de festa e envolto nesta imensa saudade, peço interceder pelas
mães que sofrem aqui na terra. Pelas mães que, aflitas, acalentam nos braços
sem forças, os filhos que choram com fome. Pelas mães sem apoio, sem lar, que
sofrem a marginalização social. Pelas mães dos filhos órfãos de pais vivos.
Pelas mães que não tiveram o direito de assumir a maternidade, por imposição
social. Pelas mães abandonadas e pelas que choram o infortúnio dos filhos
envolvidos pela perversão social.
No vazio da solidão, acompanhado pela saudade que veste a nudez da minha
vida, resta-me o agradável consolo de ter possuído e vivido a grandeza de seu
amor, o imenso amor de mãe. Com você aprendi a caminhar em busca de um mundo
onde exista a fraternidade, a compreensão e o amor. Percebi com a sua
convivência que ser mãe é um privilégio das almas puras e dos espíritos de luz.
Ser mãe é ter força, é acreditar, ter coragem, abnegação, espírito de humildade
e renúncia. Ser mãe é semear rosas, mesmo que os espinhos venham lhe ferir as
mãos. Ser mãe é a mais sublime determinação divina, é sofrer sorrindo, é morrer
para dar vidas, é adquirir o direito de padecer sempre.
A minha saudade é a
sua presença. As minhas lágrimas o seu amor. Seu filho saudoso, Eudes.
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