O sertão está em
desespero, com o sol abafadiço queimando, sob nosso olhar tristonho, as
esperanças depositadas nas plantações, que também tombam estorricadas pelo
hálito morno da terra que se arde em febre.
Senhor, por que
tanto sofrimento? Por que sofremos tamanho castigo? Se O ofendemos com tanta
veemência, se nossos pecados foram tamanhos, mostra-nos, de uma vez, o caminho
certo a seguir, pois jamais tivemos o propósito de O ofender tanto. Estamos
aflitos porque não queremos perder a fé, que nos faz resistir a todos os
percalços. A confiança em sua proteção transforma nossa fragilidade em
intransponível muralha de pedra. Não queremos, pois, perder nossa única fonte
de esperanças. Não nos deixe Senhor. Aceitamos a reprimenda pelas nossas
faltas, mas não temos forças para resistir ao vazio de Seu abandono.
Nossas plantações,
SENHOR, estão morrendo. Nossos açudes secos, e os animais caminham inquietos
nos campos sem forragem, com fome e com sede. Nosso trabalho, nossos esforços,
nossas esperanças, foram esmagados pela fatalidade da seca.
Não permita,
Senhor, que os nossos destinos fiquem na dependência de planos elaborados por
homens incapazes, sem consciência, ambiciosos, indiferentes aos nossos
sofrimentos. Estamos entediados de tanta angústia, nossa paciência também deve
ter limite. As injustiças, mesmo que não queiramos, tenderão a indicar outros
caminhos, inclusive o da violência. Por mais que queiramos suportar. Por maior
que seja a nossa resignação. Por mais tolerantes que queiramos ser, haveremos
de, um dia, nos deixar envolver pela revolta, a exemplo do que Lhe aconteceu,
quando teve que reagir à imprudência dos mercadores, que profanavam o templo de
Seu Pai.
Volte, SENHOR, os
olhos para este sertão. Venha, novamente, em socorro desta gente. Perdoe, mais
uma vez, as nossas ofensas, os nossos pecados, e as nossas profanações. Não nos
expulse desta terra seca, onde sofremos, mas que amamos com toda a força de
nossa alma.
Não permita que
este solo seja apenas molhado pelas lágrimas dos que partem para outras plagas,
onde irão sofrer muito mais. Não permita que esta terra seca seja umedecida
somente pelo pranto dos que teimam em aqui permanecer, agarrados ao pó que se
levanta à passagem dos retirantes.
Se tanto pecamos;
se O ofendemos a ponto de merecer tamanho castigo, perdoa-nos, Senhor. Se nós
chegamos ao desespero e se a revolta superou a fé, foi porque estamos exauridos
de tanto massacre, tanta injustiça e de tanta coação, vencidos pela sanha de
nossos implacáveis algozes.
Se agredidos pelos
poderosos da terra, venha, SENHOR, em nosso auxílio. Deixe a chuva cair para
amenizar esta febre que aquece a terra, queima as nossas plantações, secam as
nossas fontes de água, e nos vai matando pouco a pouco. Se não merecemos
compaixão, tenha piedade dos animais que sofrem as conseqüências da maldade da
terra, e se aglutinam em torno de nós, para sofrerem também, para chorarem e
morrerem conosco, castigados pela terrível seca.
Se nossa fraqueza,
nossa maldade superam o limite da tolerância e se nossas faltas merecem tamanha
punição, rogamos pelas crianças que, na sua inocência, brincam com as bonecas
de milho que não frutificaram. Que secaram pela inclemência do sol, pela falta
de chuvas. Aquela criança sentar-se-á em vão, em torno de uma mesa, que há
muito está e continuará vazia. Quando a fome chegar com maior intensidade as
crianças são as que mais irão chorar, Sentindo falta da boneca de milho que se
desfez em suas mãos, como a colheita que desapareceu após se constituir na
grande esperança do agricultor.
Senhor, nesta hora
difícil, olha para o meu sertão. Permita também que anjos e santos também
volvam o olhar para esta terra que se arde na fogueira do desespero.
Olhando-nos do céu, terão compaixão de nosso sofrimento, e, juntos, chorarão a
nossa dor. As lágrimas descerão pelas nuvens, molharão a terra, cairão sobre as
plantações, os campos renascerão e tudo ficará alegre.
Somente assim
veremos partidos os grilhões que já nos prendem os pulsos. Com nossas mãos
livres, nossos pecados perdoados e com a ajuda da bendita chuva voltaremos ao
amanho da terra para renovar nossas esperanças. Crianças contentes, animais
pastando fartamente, os pássaros haverão de voar bem alto levando a nossa
mensagem de fé, de esperança e gratidão. Na terra ficarão homens que tocam no
peito agradecendo e com olhos fitos no céu dirão, respeitosamente: OBRIGADO
SENHOR.
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